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TRANSPARÊNCIA DOS GESTORES DE ATIVOS, ASPECTOS DO ART. 3º-I DA DIRETIVA 2017/828/CE União Europeia

  • Foto do escritor: Carlos Alexandre Lorga
    Carlos Alexandre Lorga
  • 30 de out. de 2019
  • 9 min de leitura

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Introdução

Tem a presente a proposta de debater os aspectos contidos no art. 3º-I da Diretiva 2017/828 do Parlamento Europeu e do Conselho em que são tratados objetivos no que se refere aos incentivos ao envolvimento dos acionistas a longo prazo considerando que as ações de sociedades cotadas são frequentemente detidas através de cadeias complexas de intermediários, tornando o exercício do direito dos acionistas proporcionalmente dotado de complexidade de e dificuldades.

Em matéria constitucional a iniciativa econômica privada é livre nos termos delineados pela Constituição da República Portuguesa e nos termos da Lei Nacional (art. 61º). As sociedades comerciais integram o setor privado (art. 82º, nº 3, CRP), e formam uma rede complexa de negócios jurídicos, tanto para o interesse das sociedades comerciais, quanto no interesse coletivo participado pelo desenvolvimento econômico sustentável em várias dimensões (ex: função social das sociedades comerciais no âmbito do desenvolvimento econômico e a responsabilidade social). Também temos relações contratuais complexas (ex: fundos de investimento, planos de pensões, seguros, etc). E não alheio a esta complexidade a Governação das Sociedades, com a presença de negócios jurídicos típicos, como já dito, através de complexas cadeias de intermediários.

Tal cadeia complexa, visando a proteção do exercício do direito dos acionistas, levou a comum necessidade de o Bloco europeu definir diretrizes traduzidos em objetivos para uma uniformidade de atos estruturantes visando a segurança jurídica. Segurança jurídica que envolve relações dos mercados de capitais em que as sociedades de cotas e que os gestores de ativos exercem atuação.

Há de se ter razoáveis diretrizes de proteção para a promoção da sustentabilidade econômica do bloco, especialmente pois já experimentadas em crises anteriores, em parte, de responsabilidade da imprudente atuação de gestores de ativos (2008/2009 – Recessão USA, 2009/2010 dívida na Europa|caso da Grécia).

Esta necessidade de implementação e transposição de normas com interesse comum legitima o bloco a propor atos legislativos.

A União Europeia[1]: Para exercerem as competências da União, as instituições (que são 7)[2]adotam regulamentos, diretivas, decisões, recomendações e pareceres. A diretiva, que é o ato legislativo da União aqui em estudo, vincula o Estado-Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios.

Portanto, Diretiva: é um ato legislativo que fixa um objetivo geral que todos os países da UE devem alcançar. Contudo, cabe a cada país elaborar a sua própria legislação para dar cumprimento a esse objetivo[3]. Cada diretiva prevê um prazo para os países da UE transporem as suas disposições para a legislação nacional e informarem a Comissão.

A Comissão da União Europeia em maio de 2003 dirigiu comunicado ao Conselho e ao Parlamento Europeu por meio de documento intitulado de: “Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia — Uma estratégia para o futuro”.

Adiante a União emitiu a Resolução de 21 de abril de 2004 em que o Parlamento, dentre outros assuntos, afirma apoio às intenções da Comissão de reforçar os direitos dos acionistas, em particular mediante o alargamento das normas de transparência, e outras.

A DIRETIVA 2007/36/CE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 11 de julho de 2007 em matéria de “alargamento das normas de transparência” não aborda a participação dos “gestores de ativos” nas sociedades de cotas.

Vem fazer na DIRETIVA (UE) 2017/828 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 17 de maio de 2017, alterando a Diretiva 2007/36/CE.

Na recente Diretiva, no que importa ao “alargamento da transparência”, traz alterações e inclui novas definições para fins estabelecer os atores(sujeitos) e os destinatários da referida Diretiva, dentre as quais, para efeitos deste debate, temos, por exemplo definições aplicáveis a figura do: (i) Gestor de Ativos; (ii) Investidor Institucional;

Na proposta deste debate nossa definição de Transparência é intrínseca ao seu significado: então Transparência pressupõe uma qualidade sem qualquer ambiguidade, clareza, limpidez, evidência. Para a diretiva o significado de “transparência” está vinculado, além da qualidade, a uma condição necessária para a governança das sociedades, para a proteção dos direitos dos sócios e a segurança jurídica para a execução do plano de investimentos e demais efeitos nas inter-relações com os atores intrínsecos da sociedade.

A “transparência” em aspectos contemporâneos remonta os “Princípios para o investimento responsável” (Nações Unidas). Na fala do Sr. Secretário Geral da ONU, Ban Ki-moon: “Os Princípios para o Investimento Responsável (PRI), com o apoio da ONU, vêm ajudando a corrigir esta distorção, trazendo maior clareza para a relevância financeira dos temas ambientais, sociais e de governança (ESG), fornecendo um modelo para que a comunidade mundial de investimento contribua com o desenvolvimento de um sistema financeiro mais estável e sustentável”.

O objetivo dos Princípios é compreender as implicações do investimento sobre temas ambientais, sociais e de governança, além de oferecer suporte para os signatários na integração desses temas com suas decisões de investimento e propriedade de ativos.

Tratar da “transparência dos gestores de ativos” caminha no mesmo sentido da responsabilidade destes agentes, especialmente no plano de investimento e sua execução esperado em prol dos investidores institucionais.

Alinha-se tal “transparência” ao disposto na alínea c) do nº 1 do art. 21º do Código das Sociedades Comerciais, na medida que assiste ao sócio obter informações sobre a vida da sociedade, combinado como disposto art. 65º que institui o “relatório de gestão” exigido dos membros da administração da sociedade, e trazido, pontualmente aos gestores de ativos no anteprojeto para transposição da Diretiva 2017/828 no art. 251º-D.

Definições (art. 2º da Diretiva)

Gestores de ativos:

Estão definidos nas Diretivas 2009/65/CE,; 2011/61/CE, 2014/65/EU, 2017/828/EU. Delas se extrai “tipos” de gestores de ativos.

(i) uma empresa de investimento[4] que presta serviços de gestão de carteira a investidores.

(ii) um Gestor de Fundos de Investimento Alternativos (GFIA)[5] que não preenche as condições de isenção[6].

(iii) uma sociedade de gestão[7]

(iv) uma empresa de investimento autorizada[8], desde que não tenha designado uma sociedade de gestão autorizada nos termos dessa diretiva para a gerir;

Investidor institucional:

(i) uma empresa que realiza atividades de seguro de vida[9] e atividades de resseguro[10], desde que essas atividades abranjam obrigações em matéria de seguro de vida, e que não está excluída nos termos dessa diretiva.

(ii) uma instituição de realização de planos de pensões profissionais[11]

Motivos para as providências estabelecidas no art. 3º - I segundo a contextualização da Diretiva:

(i) Na comunicação de 12 de dezembro de 2012, intitulada “Plano de ação: Direito das sociedades europeu e governo das sociedades — um quadro jurídico moderno com vista a uma maior participação dos acionistas e à sustentabilidade das empresas”, a Comissão anunciou uma série de ações no âmbito do governo das sociedades destinadas, nomeadamente, a incentivar o envolvimento a longo prazo dos acionistas e a aumentar a transparência entre as sociedades e os investidores.

(ii) indícios de que os mercados de capitais exercem pressão nas sociedades para operações a curto prazo, o que pode pôr em risco o seu desempenho financeiro e não financeiro a longo prazo das sociedades.

(iii) gestores de ativos não transparentes no que se refere às suas estratégias de investimento, as políticas de envolvimento nas sociedades e a execução das estratégias de investimento.

A Diretiva 2017/828 UE

Artigo 3º-I

Diretiva 2017/828 UE

Transparência dos gestores de ativos

1. Os Estados-Membros devem assegurar que os gestores de ativos informem anualmente o investidor institucional com o qual tenham celebrado os acordos referidos no artigo 3.o-H[12]sobre a forma como a sua estratégia de investimento e a sua execução respeitam esse acordo e contribuem para o desempenho de médio a longo prazo dos ativos do investidor institucional ou do fundo. Essas informações devem incluir um relatório sobre os riscos essenciais relevantes de médio a longo prazo associados aos investimentos, sobre a composição, a rotação e os custos de rotação da carteira, sobre a utilização de consultores em matéria de votação para as atividades de envolvimento e para a sua política de empréstimo de valores mobiliários, e a maneira como essa política é executada a fim de desempenhar as suas atividades de envolvimento, se aplicável, em particular por ocasião da assembleia-geral das sociedades participadas. O relatório deve incluir também informações sobre se os gestores de ativos tomam as decisões de investimento com base na avaliação do desempenho de médio a longo prazo da sociedade participada, incluindo o desempenho não financeiro, e, em caso afirmativo, sobre a forma como o fazem, e sobre se existiram conflitos de interesses em relação às atividades de envolvimento e, em caso afirmativo, quais, e que tratamento lhes foi dado pelos gestores de ativos.

2. Os Estados-Membros podem prever que as informações referidas no nº 1 sejam divulgadas juntamente com o relatório anual referido no artigo 68º da Diretiva 2009/65/CE ou no artigo 22º da Diretiva 2011/61/UE, ou com as comunicações periódicas referidas no artigo 25º, nº 6, da Diretiva 2014/65/UE.

Caso as informações divulgadas nos termos do nº 1 já estejam disponíveis ao público, o gestor de ativos não é obrigado a fornecer diretamente as informações ao investidor institucional.

3. Os Estados-Membros podem prever que, se o gestor de ativos não gerir os ativos de forma discricionária, cliente a cliente, as informações divulgadas nos termos do nº 1 sejam também fornecidas aos outros investidores do mesmo fundo, pelo menos a pedido.

Sujeito ativo: Gestores de ativos

Sujeito passivo: Investidor institucional

Ação: Informar sobre a forma da estratégia de investimento e sua execução, por meio de relatórios sobre:

(i) riscos essenciais e relevantes de médio e longo prazo relacionados aos investimentos;

(ii) a composição, a rotação e os custos de rotação da carteira;

(iii) a utilização de consultores em matéria de votação para as atividades de envolvimento e para a política de empréstimo de valores mobiliários, e a maneira como essa é executada.

Deve, ainda, o relatório conter informações sobre:

(i) se os gestores de ativos tomam as decisões de investimento com base na avaliação do desempenho de médio a longo prazo da sociedade participada, inclusive quanto ao desempenho não financeiro.

(ii) Conflitos de interesses, informando quais se houverem.

Em matéria de informação no âmbito da responsabilidade dos gestores de ativos, Danny Buch e Déborah A. DeMott[13], destacam, como previsto no art. 25º da Diretiva 2014/65 que os gestores de ativos (empresas de investimento) devem atuar de forma honesta, equitativa e profissional, em função do interesse dos clientes (no caso da Diretiva 2017/828 no interesse das sociedades). Isto posto a transparência, de certa forma, é a exteriorização destes pressupostos.

O que se espera com a transparência dos gestores de ativos:

(i) Um impacto positivo na percepção dos investidores, de forma a permitir a estes beneficiários a tomada mais adequada nas decisões de investimento.

(ii) Ser facilitador do diálogo das sociedades para com seus acionistas.

(iii) Fomentar o envolvimento dos acionistas nas sociedades.

(iv) Reforçar a responsabilidade dos gestores de ativos perante a sociedade.

(v) Investidores institucionais e gestores de ativos deverão ser mais transparentes que venham demandar o envolvimento dos acionistas.

(vi) Investidores institucionais e gestores de ativos deverão elaborar e divulgar ao público uma política de envolvimento dos acionistas.

Anteprojeto de Diploma (Transposição)

O nº 8 do art. 112º da CRP estabelece que os atos legislativos da União Europeia serão transpostos para as normas nacionais na forma de Lei, decreto-lei, ou nos termos do decreto legislativo regional.

O anteprojeto que tem por objeto a transposição do disposto na Diretiva 2017/828 do Parlamento Europeu e do Conselho é ato legislativo na forma de lei.

Art. 251º - D

Transparência dos gestores de carteiras

1 – Os intermediários financeiros que prestem serviços de gestão de carteiras por conta de outrem, na medida em que invistam em ações negociadas no mercado regulamentado em nome de investidores, informam anualmente o acionista investidor institucional com o qual tenham celebrado os acordos referidos no artigo anterior sobre a forma como a sua estratégia de investimento e a sua execução respeitam esse acordo e contribuem para o desempenho de médio a longo prazo dos ativos do acionista investidor institucional ou do fundo.

2 – As informações referidas no número anterior incluem um relatório sobre:

a) Os riscos essenciais relevantes de médio a longo prazo associados aos investimentos;

b) A composição, a rotação e os custos de rotação da carteira;

c) A utilização de consultores em matéria de votação para as atividades de envolvimento e para a sua política de empréstimo de valores mobiliários; e

d) A maneira como essa política é executada a fim de desempenhar as suas atividades de envolvimento, se aplicável, em particular por ocasião da assembleia-geral das sociedades participadas;

e) se os intermediários financeiros tomam as decisões de investimento com base na avaliação do desempenho de médio a longo prazo da sociedade participada, incluindo o desempenho não financeiro, e, em caso afirmativo, a forma como o fazem,

f) se existiram conflitos de interesses em relação às atividades de envolvimento e, em caso afirmativo, quais, e que tratamento lhes foi dado pelos acionistas gestores de ativos.

3 – As informações referidas no número anterior são divulgadas juntamente com as comunicações periódicas referidas no n.º 1 do artigo 323.º.

4 – Caso as informações divulgadas nos termos do n.º 1 já estejam disponíveis ao público, o intermediário financeiro que preste serviços de gestão de carteiras por conta de outrem não é obrigado a fornecer diretamente as informações ao acionista investidor institucional.


Conclusões:


(i) A transparência é uma das dimensões da sustentabilidade da governação das sociedades para a consecução do direito dos acionistas.


[1] Art. 288 – Tratado sobre o funcionamento da União Europeia

[2] Art. 13º Tratado da União Europeia: — o Parlamento Europeu, — o Conselho Europeu, — o Conselho, — a Comissão Europeia (adiante designada "Comissão"), — o Tribunal de Justiça da União Europeia, — o Banco Central Europeu, — o Tribunal de Contas.

[3] https://europa.eu/european-union/eu-law/legal-acts_pt

[4] (Art. 4º nº 1, ponto 1, da Diretiva 2014/65/UE) Qualquer pessoa coletiva cuja ocupação ou atividade habitual consista na prestação de um ou mais serviços de investimento a terceiros e/ou na execução de uma ou mais atividades de investimento a título profissional;

[5] (Art. 4º nº 1, alínea b da Diretiva 2011/61/CE)

[6] (Art. 3º da Diretiva 2017/828/UE)

[7] (Art. 2º, nº 1, alínea b, da Diretiva 2009/65/CE)

[8] (Diretiva 2009/65/CE)

[9] (artigo 2º , nº 3, alíneas a, b, c, da Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho)

[10] (Art. 13, nº 7 Diretiva 2009/138/ CE)

[11] (Diretiva (UE) 2016/2341 do Parlamento Europeu e do Conselho)

[12] Instrumento jurídico tendo por objeto a Estratégia de investimento dos investidores institucionais e acordos com os gestores de ativos

[13] LIABILITY OF ASSET MANEGERS, Oxford University, 2012, p.47, 2.76


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